18.1.10

Lembro-me perfeitamente do dia em que colou cem post-its nas paredes do quarto para se lembrar a si mesma que era capaz. Ela pensava que nessa altura não acreditava mas afinal, essa altura é agora. Meia perdida havia encontrar uma motivação, nem que fosse mais uma mão cansada de escrever num bloco de notas e espalhar pelas paredes, é uma terapia que funciona. Ou então procurar por mais terapias que resultem. Respirar e pensar seria uma delas, mas é coisa que não lhe apetece agora. Personalidades já um pouco desfocadas do seu propósito, daquilo que gostariam de ser, desgastada por estar rodeada da eterna futilidade que tem vindo a evitar todos os dias, cansada da banalidade das pessoas, ou então até da sua que, sem querer, já lhes segue o passo- pensa. Corre pelas ruas da sua imaginação esperando que uma nova música comece a tocar, quem sabe não lhe dirá algo novo, algo em que nunca pensou, continua a correr, quer sempre mais, deseja mais do que aquilo que tem. Não se tratam de futilidades mas sim desejos pessoais e corre porque sempre a ensinaram que esta é a forma de os alcançar. À sua volta uma multidão de pessoas corre também, porém, na direcção oposta, às vezes formando um obstáculo na sua frente, de forma a que caia ou tropece na confusão. A partir do momento em que começa a reconhecer algumas pessoas nessa multidão, continua a correr mas desta vez mais lentamente, com a esperança que a sigam pois ela acredita que aquele é o caminho certo. Detesta bloqueios momentâneos, coisas desarrumadas na sua cabeça e acima de tudo, gosta de tirar o que já não faz falta. Às vezes gosta de escrever com rodeios, enfeites desnecessários, outras gosta de ser directa, sem desvios. Era do que se tratava agora: achava os rodeios uma falta de tempo que se viria a converter numa queda. As árvores continuavam a balançar ao som do vento que a assustava com a sua violência, ouvia zumbidos de abelhas, vozes que a marcaram, traços da vida, não só da sua como dos outros também. Afinal era disso que ela era feita, de momentos, de recordações. Como ela gostava de escrever sobre tudo, de se deitar pela noite e ficar a recordar qualquer coisa que lhe viesse à cabeça. Podemos dizer que era o seu passatempo preferido. Esse e escrever textos na terceira pessoa: não gostava de se tratar por tu, amedrontava-a. Nessa correria, alguns seguiam-na, como isso a fazia ficar feliz, fazia-a crer que era capaz, que podia concretizar algo, que podia ser alguém. O tempo passava mas ela sentia que nada tinha feito, apenas continuava a correr com o objectivo de nunca chegar ao fim. Pelo caminho deixava quem se desinteressava dessa caminhada, ou seguia outra seta. Ela era de ideias fixas, não se deixava influenciar. Muitos estão à espera dela, quem sabe a metade do caminho... Mas, até quando?

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