Quando fui para a universidade e, consequentemente, viver sozinha, não fazia nem uma pequena ideia daquilo que viria a ser. Não tinha noção nenhuma, não tinha expectativas e confesso que ainda hoje não sei avaliar aquilo que realmente é. As semanas em Aveiro sempre passaram a correr, eu adoro lá estar e isso para mim sempre foi um ponto a meu favor e talvez daí as saudades da
verdadeira casa não atingirem outra dimensão. Já chorei de saudade, na primeira semana custou imenso, - sim, essa é que parecia não terminar - já liguei à minha mãe naqueles momentos em que me sentia sozinha, já me questionei o que estaria ali a fazer, quando ligava a televisão à noite e fazia o
zapping habitual, já tentei perceber a minha mudança de humor tão rápida que passava por mim à velocidade da luz. Enfim, já por lá senti muitas coisas - boas e más - mas nem por isso deixo de gostar de lá estar. É uma nova etapa. Nestes dois meses e umas semanas que lá estive, habituei-me à
rotina dos fins-de-semana, durante dois dias
queria tempo pra rever os amigos, a família, o
afilhado, o Bergas (é o meu amado cão), saber as novidades, rever os cantos à casa, sentir o calor dos meus cobertores, gravar na memória o cheiro dos cozinhados da minha avó, as vozes das pessoas que me completam, os beijos, os abraços, as palavras de saudade, e a certeza de todos os domingos ouvir um "Boa sorte, boa viagem!". Comecei a gostar desta rotina. A adorar, aliás. Comecei a sentir as pessoas mais próximas de mim, - independentemente da distância, a saudade consegue aproximar - comecei a dar mais valor a pequenos minutos da minha vida e a guardá-los para mim. Guardava tudo o quanto podia e levava também, todas as coisas que me faziam pertencer mais aqui. Levei o meu copo - esse sim, é realmente meu - mas tudo o resto que eu levei foi apenas com o intuito de me sentir mais perto de casa e não por ser realmente meu.
Sempre fui muito agarrada às coisas, sempre fui de guardar tudo o que me fazia ter uma recordação.
O meu quarto eram só papeis amassados com pequenas mensagens - mesmo que indiferentes -, bilhetes de cinema, cadernos da escola, recibos e talões de supermercado, coisas que mesmo estragadas ou partidas ainda faziam todo o sentido para mim. Sempre gostei de tornar tudo eterno até ao dia em que percebi que isso não era possível. Afinal, era o que eu queria fazer quando guardava tudo ao mais ínfimo detalhe - guardar situações e torná-las eternas. Dei por mim a entender que afinal, muitas coisas tinham um fim, quando comecei a perder amiga(o)s, quando tive a percepção de que aquilo que eu guardava e achava especial podia não ser para a outra pessoa. Arrematei algumas desilusões com esta minha forma de ser. Felizmente mudei. Ou achava eu... Hoje em dia, noto que volto a ter a mesma tendência que tinha há uns tempos mas de uma outra forma: ao invés de guardar as coisas materiais, guardo-as na memória. E isso preocupa-me, porque com a quantidade de coisas que sinto necessidade de memorizar e guardar, por este andar, vou ter de investir em muitas memórias até ao final da minha vida! Enfim, hei-de ser saudosista até morrer.
(Fotos: O meu Bergas e o meu quarto de sempre.)